terça-feira, 3 de julho de 2018

Revogação da Lei nº 13405/16 (Reforma do Ensino Médio)

A mobilização Que forçou o cancelamento da Audiência Pública de 08/06 foi decisiva para o atual e acertado posicionamento de Cesar Callegari. "Carta aos conselheiros do Conselho Nacional de Educação" A Aproffesp e a Aproffib tem se posicionado contrarias a esta Reforma desde sua apresentação na forma de Medida Provisória imposta pelo governo Golpista. O tema será norteador do Nosso IV Encontro Estadual de Professores/as de filosofia que se realizará dias 12, 13 e 14 de setembro na Alesp. É imprescindível nossa mobilização.


Carta de Repúdio à Medida Provisória 746/16 da reforma do ensino médio aprovada no III Encontro Estadual de Professores de Filosofia

Nós, filósofos e filósofas, professores e professoras de filosofia do Estado de São Paulo, reunidos no III Encontro de professores de Filosofia e Filósofos – APROFFESP – na cidade de São Paulo, cumprindo nosso papel histórico de fazer críticas e proposições quanto ao que ocorre em nossa sociedade, repudiamos veementemente o golpe contra a Educação Brasileira desfechado pelo ilegítimo governo de Michel Temer através da modificação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n° 9.394/96) por meio de Medida Provisória referente à reforma do ensino médio, sem qualquer diálogo com a comunidade acadêmica e escolar no Brasil, o que se assemelha aos Atos Institucionais da última Ditadura Militar no país.

Do mesmo modo que aquele regime de exceção reprimiu duramente o pensamento crítico durante sua vigência, o atual desgoverno de Michel Temer golpeia ainda de maneira mais incisiva a educação brasileira, permitindo que entre no âmbito da escolha por parte dos sistemas de ensino conhecimentos básicos para a formação do brasileiro. A medida faz retroceder a educação no país em mais de trinta anos e contribuirá para uma das mais acentuadas divisões sociais já vistas no país. Falsamente apresentada como “flexibilização”, a reforma elimina a obrigatoriedade de componentes curriculares filosóficos e científicos e desconsidera dimensões essenciais para a formação humana, fechando as portas para a ainda não realizada produção universalizada do conhecimento em nosso país. A inclusão das disciplinas de Filosofia e Sociologia no ensino médio resultou de um longo debate no seio da sociedade brasileira, que mobilizou amplos setores ligados à educação desde a redemocratização do país e que passou por um revés com o veto lamentável de Fernando Henrique Cardoso em 1998, retardando em dez anos a volta das citadas disciplinas no currículo escolar do ensino médio que foram finalmente incluídas somente em 2008 através da Lei 11.684/08. A MP N° 746, numa canetada, suprimiu o Artigo 36 da LDB que havia sido alterado pela citada lei, eliminando novamente a obrigatoriedade da inclusão da Filosofia e da Sociologia no currículo do ensino médio! A menção a “conhecimentos filosóficos ou sociológicos” a que se referia a LDB é retomado e até de forma piorada pela medida provisória; portanto, a presença da Filosofia ou da Sociologia como disciplinas não está garantida!O ensino da Filosofia, da Sociologia e das demais disciplinas das ciências humanas são condição de possibilidade para a formação de espíritos livres e reflexivos, capazes de pensar e agir diante dos desafios da vida contemporânea. O ensino de filosofia, que nos últimos anos foi pela primeira vez na história do país universalizado, deveria ser preservado e estendido e nunca eliminado como pretendem os sempre ativos defensores do tecnicismo estreito e míope. Não se forma apenas para o “mercado de trabalho”, mas para a cidadania, para uma existência consciente e solidária, se forma para a vida!Além do mais, é um erro pedagógico imaginar que se possa melhor aprender matemática e português sem exercitar o raciocínio lógico, as habilidades linguísticas e conceituais, que são desenvolvidas em todas as outras disciplinas. A consequência dessa precarização é evidente: o ingresso no ensino superior desses jovens será ainda mais prejudicado e o próprio ensino superior adequado a fornecer mínimos conhecimentos não adquiridos no ensino médio terá sua função radicalmente alterada.Permitir a contratação de professores, reconhecidos pelos políticos de turno como sendo de “notório saber”, revela-se um descaso com a necessária rigorosidade com a formação docente, desconhecimento e desrespeito pela profissão “professor”. A especificidade dessa profissão que conjuga formação pedagógica com a especificidade e aprofundamento em conhecimentos de sua disciplina de atuação é incompatível com a chamada “interdisciplinaridade” proposta pela reforma que elimina disciplinas e não as coloca em relação e, ainda pior, coloca alguém para ensinar algo que não conhece os métodos e quiçá os conteúdos desta ou daquela área do saber. Será que os defensores de tal despropósito deixariam seus filhos ou familiares serem tratados por um médico de “notório saber”?Outro agravante é que os milhares de professores que estão habilitados para lecionar disciplinas hoje no ensino médio serão jogados ao desemprego, seja por eliminação ou redução de carga horária de disciplinas, seja porque poderão ser substituídos por outros profissionais não habilitados e cuja decisão ficará a cargo da decisão de terceiros sobre a relevância ou não daquilo que se ensina.Se não bastasse as consequências maléficas acima indicadas, fica também evidente que esse é um projeto para excluir mais uma vez as classes populares do acesso à educação. Os estudantes das camadas populares e periféricas que trabalham no período diurno e estudam no período noturno serão obrigados a evadir-se da escola, pois não terão tempo disponível para cumprir com a nova carga horária exigida. Aos que ficarem será oferecido conhecimento segundo a região geográfica e diversas regiões no país ficarão com carga horária menor de áreas científicas e filosóficas, restringindo a formação do estudante pobre à mera alfabetização seguida de formação profissional de baixa qualidade. Desta forma, o dualismo que ter marcado a educação brasileira desde os tempos coloniais será piorado, o que constitui um verdadeiro crime contra os filhos dos trabalhadores que terão poucas oportunidades de ascenderam a uma formação mais ampla e especializada. Tal medida, por tudo o que acabamos de mencionar, tende a estimular a marginalidade, a violência social e a divisão de classes de maneira até agora ainda não vista no país. Revela-se aqui o caráter elitista e obscurantista desse desgoverno que viola a democracia e segue suprimindo os direitos da população brasileira, principalmente dos mais vulneráveis.Por tudo isso, convocamos os professores e professoras que resistam e se rebelem contra essa reforma que desfigura, fragiliza e empobrece a educação brasileira.Nenhum direito a menos!

São Paulo, 09 de dezembro de 2016.

APROFFIB - Associação dos Professores de Filosofia e Filósofos do Brasil
APROFFESP - Associação dos Professores de Filosofia e Filósofos do Estado de São Paulo


LEITURA E DEBATE OBRIGATÓRIOS: Carta aos conselheiros do Conselho Nacional de Educação (Cesar Callegari)

Colegas conselheiras e conselheiros membros do Conselho Nacional de Educação.
Por quase dois anos venho tendo o privilégio de contar com a sua confiança na presidência da Comissão Bicameral do CNE encarregada da Base Nacional Comum Curricular. Em meus três mandatos como membro deste Conselho este foi o período de maiores intensidades, marcado pelos desafios relacionados às discussões sobre as propostas de BNCC elaboradas pelo MEC. Neste momento, por respeito e consideração a cada um de vocês, sinto-me no dever de compartilhar reflexões e posicionamentos e, ao final, apresentar propostas e comunicar decisão que, espero, possam merecer a sua atenção e compreensão.
Na presidência da Comissão procurei cumprir minhas responsabilidades com o devido respeito e apreço aos colegas e a necessária atenção a todos aqueles que nutriram as melhores e maiores expectativas em relação ao CNE como órgão de Estado sensível aos anseios da sociedade.
Em que pesem todas as circunstâncias, tensões e conflitos políticos, econômicos e sociais que vêm marcando a atual quadra da história brasileira, pode ser considerada uma grande proeza que o CNE tenha conseguido conduzir, de forma democrática e produtiva, a tarefa de elaboração da norma instituidora da BNCC relativa ao Ensino Fundamental e à Educação Infantil. Atravessamos mares revoltos. Seja no ambiente interno, seja no relacionamento com o MEC, seja ainda nas nossas relações com diferentes grupos e segmentos da sociedade. Soubemos organizar e realizar audiências públicas com a mais ampla liberdade de manifestação, assim como participamos de reuniões de trabalho em todas as regiões do Brasil. Com espírito público resolvemos desavenças entre nós, interagimos com inúmeras entidades, grupos e pessoas interessadas no tema e analisamos centenas de documentos do mais variado teor. Fomos atacados e fomos apoiados. Fomos alvo de críticas, mas também destinatários de numerosas e valiosas contribuições. E, ao final, logramos êxito. Por maioria de votos e também pela qualidade da participação daquelas conselheiras que, por votos e ideias, se opuseram à aprovação da BNCC defendendo outras visões, o CNE aprovou o Parecer CNE/CP nº15/2017 e a Resolução CNE/CP nº 2/2017. Pela primeira vez na história, o Brasil passa a contar com uma Base Nacional definidora dos direitos e objetivos de aprendizagem e desenvolvimento das crianças, jovens e adultos, a BNCC. Votei a favor do parecer dos relatores aprovando a Base e declarei em voto as minhas não poucas restrições. Votei a favor não só por ter coordenado os trabalhos da Comissão, apoiado as tarefas dos relatores e negociado avanços com o MEC; votei favorável também por ter concluído que, apesar de tudo, o resultado final contém mais qualidades que defeitos e que poderá representar uma efetiva contribuição para a Educação em nosso país.
De todo modo, já temos uma BNCC. Incompleta e certamente imperfeita, é verdade. Uma norma que sempre estará sujeita a aperfeiçoamentos e complementações. Um referencial que os educadores brasileiros, seus alunos e suas famílias haverão de analisar, interpretar, discutir e sobre ele criar. Uma obra necessariamente inacabada porque sempre sujeita a modificações. Caberá ao CNE responder em produção normativa complementar a todas as questões que venham a ser levantadas quando a BNCC começar a chegar no “chão da escola”. E, mais importante: cabe ao CNE zelar pelo respeito à norma, fazendo com que sejam observados os dispositivos que asseguram a autonomia das escolas, redes e sistemas de ensino na elaboração e implementação de seus currículos e projetos pedagógicos. Como bem definimos, BNCC não é currículo. O CNE deve ser vigilante contra tentativas de reduzi-la à condição de currículo único e currículo mínimo como lamentavelmente parece já estar acontecendo.
Como sabem, nunca deixei de ter minhas próprias posições e convicções, como também minhas dúvidas e incertezas. Todavia, na presidência de um colegiado tão qualificado e plural como é a Comissão da BNCC, não poucas vezes preferi silenciar para propiciar as falas e as escutas, conciliar quando o impulso era tomar partido e disputar, insistir e animar mesmo quando a pressões maiores tentavam obstruir ou desqualificar o trabalho. A presidência de uma Comissão como a nossa requer conduta firme, sensível, imparcial e democrática. Assim, com a participação de todos e a indispensável colaboração da equipe técnica do CNE, avançamos.
No entanto, o quadro agora é outro. Temos pela frente a BNCC do ensino médio elaborada pelo MEC. Sobre ela, tenho severas críticas que considero honesto explicitar e ponderações que julgo necessário fazer.
Desde abril deste ano quando o Ministério encaminhou sua proposta de BNCC ao CNE, venho realizando estudos e reflexões sobre o tema. Procurando conhecer detalhadamente a proposta, atento às análises e manifestações que vêm sendo produzidas por diferentes atores do campo educacional brasileiro. Muitas dessas contribuições e posicionamentos começam a chegar ao CNE por meio de documentos, nos diálogos com as entidades com quem começamos a conversar, bem como resultantes das audiências públicas que já conseguimos realizar.
A primeira conclusão a que chego é que não é possível separar a discussão da BNCC da discussão da Lei nº 13405 que teve origem em Medida Provisória do Presidente da República e estabeleceu os fundamentos do que chamam de “reforma do ensino médio”. Uma coisa está intrinsecamente ligada à outra. A própria Lei é clara ao estabelecer que é a BNCC que lhe dará “corpo e alma”. Problemas da Lei contaminam a BNCC. Problemas da Base incidirão sobre a Lei.
A meu ver, a proposta de BNCC elaborada pelo MEC evidencia os problemas contidos na referida Lei, aprofunda-os e não os supera. Ela sublinha o defeito de origem: a separação do ensino médio do conjunto da educação básica na concepção de uma BNCC. Eu e outros conselheiros insistimos nessa crítica desde o início do processo. Eis que, materializando nossos piores temores, a proposta do MEC para o ensino médio não só destoa, mas contradiz em grande medida o que foi definido na BNCC das etapas educacionais anteriores e é radicalmente distinta do que vinha sendo cogitado nas versões primeiras. Tinham, afinal, razão os que temiam rupturas e fragmentação da educação básica.
Além desse ponto, sobre a Lei nº 13405 e sobre a BNCC do MEC sinto-me no dever de explicitar ainda outras posições e opiniões, algumas delas já externadas em nossos debates internos. É preciso deixar as coisas claras por dever de lealdade aos colegas do CNE e em respeito a todos aqueles a quem devo satisfação sobre meus atos como Conselheiro.
Começo por concordar que a elaboração de uma Base Nacional que defina direitos de aprendizagem de crianças jovens e adultos e que inspire a elaboração dos currículos é estratégica (necessária, embora não suficiente) para o avanço da Educação no Brasil. Assim dispõe a Lei do Plano Nacional de Educação. Aos direitos de aprendizagem devem corresponder os deveres do Estado e da Sociedade, dos governos, das escolas e das famílias. Portanto, desde o início, a BNCC foi imaginada para ser uma base para a equidade que ajudasse a elevar a qualidade da educação brasileira. Contudo, na contramão de tudo o que se pensou, a nova Lei do ensino médio estabelece que esses direitos serão reduzidos e limitados ao que puder ser desenvolvido em, no máximo, 1800 horas. Ou seja: apenas ao que couber em cerca de 60% da atual carga horária das escolas. Pergunta-se, então: o que vai ficar de fora? Quanto de língua portuguesa, de biologia, de filosofia, de matemática, química, história, geografia, física, arte, sociologia, língua estrangeira, educação física? Quantos conhecimentos serão excluídos do campo dos direitos e obrigações e abandonados no terreno das incertezas, dependendo de condições, em geral precárias, e das vontades por vezes poucas? E mais: uma Base reduzida pode levar ao estreitamento do escopo das avaliações e exames nacionais que já consolidaram um papel marcante no nosso sistema educacional. E então? Exames como o ENEM também serão reduzidos, a indicar que, agora, muito menos será garantido e exigido? Incapazes de oferecer educação de qualidade, baixam a régua, rebaixam o horizonte. Essa, a mensagem que se passa para a sociedade.
Como se pode constatar no documento preparado pelo MEC, com exceção de língua portuguesa e matemática (que são importantes, mas não as únicas), na sua BNCC desaparece a menção às demais disciplinas cujos conteúdos passam a ficar diluídos no que se chama de áreas do conhecimento. Sem que fique minimamente claro o que deve ser garantido nessas áreas. Contudo, sabemos que os direitos de aprendizagem devem expressar a capacidade do estudante de conhecer não só conteúdos, mas também de estabelecer relações e pensar sobre eles de forma crítica e criativa. Isso só é possível com referenciais teóricos e conceituais. Ao abandonar a atenção aos domínios conceituais próprios das diferentes disciplinas, a proposta do MEC não só dificulta uma visão interdisciplinar e contextualizada do mundo, mas pode levar à formação de uma geração de jovens pouco qualificados, acríticos, manipuláveis, incapazes de criar e condenados aos trabalhos mais simples e entediantes, cada vez mais raros e mal remunerados. É isso que se quer para o país? É evidente que mesmo que se mantenha a ideia de organização por áreas, torna-se imprescindível detalhar os seus elementos constituintes para além das platitudes e generalidades apresentadas na proposta do MEC.
O atual governo diz que o “novo ensino médio” já teria sido aprovado pela maioria dos jovens. Não é verdade. Nenhuma mudança chegou às escolas e talvez para a maioria elas nunca cheguem. Alardeia a oferta de um leque de opções para serem escolhidas pelos estudantes, mas na sua BNCC não indica absolutamente nada sobre o que esses “itinerários formativos” devem assegurar. Se defendemos uma Base como expressão dos direitos de aprendizagem, devemos enunciá-los para todo o ensino médio e não apenas para uma parte dele. Se mantida a arquitetura proposta pela Lei, que articula um núcleo comum com itinerários diversificados, precisa haver BNCC tanto para a parte comum nuclear quanto para cada um dos itinerários que compõem a parte diversificada. Deverá ser sobre esse conjunto integralizado na BNCC que os currículos e projetos pedagógicos serão criados, contextualizados e implementados. Trata-se, pois, de um grande e complexo trabalho ainda por fazer, envolvendo necessariamente uma ampla participação de todos os setores interessados. Obviamente, não cabe ao CNE fazer o que o MEC não quis ou não foi capaz de realizar.
Por outro lado, como falar de opções diante das baixas de condições de funcionamento das escolas brasileiras? Hoje, na maioria das unidades, pouco pode ser assegurado. A precariedade é generalizada. Em muitos colégios não há professores suficientes, não há laboratórios, não há internet e sobram alunos por sala de aula. Mais da metade dos municípios brasileiros tem apenas uma escola de ensino médio e nessa escola é comum não haver condições adequadas de funcionamento. Pergunto: como uma proposta de reforma do ensino médio pode ser apresentada sem levar em consideração seus limites e possibilidades? Onde está o necessário plano de ação para enfrentar esses problemas? Pois tanto no âmbito da Lei como no que se refere à BNCC, nada se diz sobre isso. Portanto, sem conteúdo e sem condições, não é honesto dizer que os jovens terão opções. Seria bom que tivessem. Infelizmente, para a maioria, esta miragem poderá significar ainda mais frustração e mais exclusão. Provavelmente, um maior aprofundamento das nossas atuais desigualdades.
A nova Lei abre o ensino médio para que ele seja oferecido a distância. Nesse simulacro de educação, pacotes EAD poderão substituir professores e dispensar laboratórios e bibliotecas. Pior: poderão desintegrar o território de encontros, afetos e descobertas coletivas constituído pela escola, seus estudantes e seus profissionais. Isso é muito grave! Não será isolado atrás de uma tela de computador que o jovem brasileiro vai desenvolver valores como liberdade, solidariedade, respeito à diversidade, trabalho colaborativo, o apreço à democracia à justiça e à paz. Na escola se aprende muitas coisas que não estão nos livros: estão nas relações presencias entre os estudantes e deles com seus professores e a comunidade. As novas tecnologias estão aí, mas elas devem ser utilizadas a favor da escola e não em substituição a ela. A escola precisa ser protegida e valorizada, não ameaçada. Na minha visão, a não ser em casos excepcionais já regulamentados, a participação da modalidade a distância na oferta do ensino médio não deve ser admitida, como, aliás, já orientam as atuais Diretrizes Curriculares Nacionais para essa etapa.
Destaco esses problemas para não discorrer sobre outros, como, por exemplo, o dispositivo da Lei que permite que recursos públicos da escola pública passem a ser compartilhados por instituições privadas; ou a possibilidade de que profissionais práticos com notório saber e não licenciados possam ministrar aulas na educação básica. Mas não vou me alongar.
Colegas do Conselho. O fato é que sobre todos esses problemas, não posso e não vou me calar. Tenho toda uma vida dedicada à causa da Educação marcada pela defesa de posições claras. Todavia, também cumpre propor. Lembrando Paulo Freire: não basta denunciar, também é necessário anunciar.
No que concerne à Lei nº 13405 propriamente dita, penso que ela deva ser revogada. E, a partir disso, em novas bases sociais, politicas e administrativas advindas das eleições de outubro, iniciar um amplo debate nacional com participação ativa deste CNE.
Quanto à proposta de BNCC elaborada pelo MEC, proponho que ela seja rejeitada e devolvida à origem. Seus problemas são insanáveis no âmbito do CNE. Ela precisa ser refeita.
Quanto aos trabalhos do CNE e, particularmente, os da Comissão Bicameral da BNCC, proponho uma imediata revisão da estratégia de estudos e debates, com a suspensão do ciclo de audiências públicas e a organização de uma ampla agenda de diálogos em profundidade com os diferentes setores da educação nacional. Mais do que nunca, o CNE deve assumir seu papel de Órgão de Estado, guardião dos interesses educacionais da Nação e protetor da Educação contra os males das descontinuidades e dos oportunismos.
O CNE deve deixar claro que a discussão da BNCC e da reforma do ensino médio não vai se subordinar ao calendário político e administrativo de quem quer que seja. O tema deve continuar a receber sua atenção, mas nada deve ser concluído neste ano. Isso inclui as propostas de revisão das Diretrizes Curriculares do Ensino Médio. Rodadas mais amplas e audiências públicas deverão ser retomadas no ano que vem com os novos atores referendados pelo processo eleitoral democrático que se avizinha. E, sobretudo, com a participação dos professores, dos estudantes e dos demais integrantes do campo educacional brasileiro. As manifestações que nos levaram a cancelar a audiência pública da Região Sudeste que seria realizada na Cidade de São Paulo no começo de junho deixam um recado claro: a reforma do ensino médio e a respectiva BNCC precisam ser mais amplamente discutidas. Por serem urgentes, as mudanças e melhorias na educação brasileira exigem cuidado, respeito e ousadia.
Ao defender essas posições e essas propostas perante o nosso colegiado e perante a sociedade, entendo não ser mais adequada a minha permanência à frente da Comissão Bicameral da BNCC. A presidência de um colegiado exige um esforço de imparcialidade que já não posso oferecer. Mais uma vez, agradeço por sua confiança e colaboração. Da Comissão pretendo continuar participando até o final de meu mandato de conselheiro em outubro próximo. Vou contribuir com seus trabalhos no melhor dos meus esforços em defesa de uma Educação de boa qualidade como direito de todos.
Encerro, agradecendo pela atenção dispensada a essa minha longa manifestação E, respeitosamente, solicito que sobre seu teor, especialmente sobre as propostas por mim apresentadas, as colegas conselheiras e os colegas conselheiros também se pronunciem. Recebam as minhas cordiais saudações.

Cesar Callegari
Brasília, 29 de junho de 2018


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